partos & partos

life inside, originally uploaded by “Gayatri”.

Ainda no seguimento do post de ontem, e porque é muito difícil abordar este tema de forma leve e fugaz…
Em primeiro lugar gostaria de clarificar que nem eu, nem qualquer outra doula certificada, faz a apologia do parto em casa “só porque sim”, e muito menos impinge essa posição às outras mulheres.

No meu caso concreto, e neste blog falo sempre por mim e em nome próprio, defendo o parto em casa quando a mulher assim o entende depois de devidamente informada dos riscos e benefícios.
Assim como desaconselho vivamente um parto em casa áquelas que não se sentem seguras com essa posição… precisamente porque deve ser um acto bastante ponderado e tomado em consciência, sem ser ao sabor de modas e opiniões alheias…
Mas também faço a apologia do parto em casa, e no meu trabalho como doula dou prioridade a esse tipo de acompanhamentos, porque acho que muitas mulheres que gostariam de ter os seus filhos em casa se sentem indevidamente discriminadas, e precisam de muito mais apoio emocional e logístico do que aquelas que vão para o Hospital.
E porque acho que é preciso mudar as mentalidades também em Portugal, já que por muitos outros países da Europa a opção de um parto em casa é algo perfeitamente possível para as mulheres, dentro dos adequados parâmetros de segurança na assistência.
Porque é que cá tem de ser diferente?!…
Quando defendo que qualquer mulher devia ter direito a ser devidamente acompanhada num parto domiciliar, não quero com isto dizer que todas as mulheres passem a ter obrigatoriamente os filhos em casa, como é óbvio…
Trata-se sim de um direito a escolher em segurança e dignidade.
(De certa forma como na campanha pela interrupção da IVG: ninguém defendia o aborto livre, nem tão pouco que todas as mulheres abortassem; apenas que aquelas que precisassem/quisessem fazê-lo o fizessem em condições dignas e de segurança…)

Voltando à questão dos partos, ainda bem que há mulheres com experiências de parto positivas e satisfatórias no Hospital – eu sou uma delas!
Mas infelizmente são uma excepção à regra.
A realidade dura e crua é que os Hospitais são de forma geral sítios inóspitos e hostis, o que não ajuda nada numa altura de fragilidade emocional como é um parto.
E depois temos o recorrente tema dos “médicos-que-não-explicam-os-procedimentos-às-mulheres” e as tratam como se estas fossem incapazes de decidir o que é melhor para elas numa altura como a do parto.
Sim, e digo sem qualquer problema “o melhor para elas” porque a nenhuma mulher passa pela cabeça tomar decisões que ponham em risco a vida ou o bem estar do seu filho ainda por nascer. Todas nós, enquanto parturientes, mães e mulheres, queremos o melhor para os nossos filhos, e “O melhor” não é igual em todas as famíllias e é um conceito subjectivo revestido de valores e crenças pessoais…
E a verdade é que “O melhor” que os Hospitais na sua maioria fazem, não é em defesa do supremo interesse da mãe e do bebé, mas sim em defesa de uma maior produtividade e agilização dos serviços, bem como de ressalva jurídica dos seus profissionais (só por curiosidade: sabiam que os Obstetras são os profissionais médicos com mais denúncias/processoas judiciais em todo o mundo?…)
O que assistimos hoje em dia é uma teia de defesa do sistema, em vez de defesa dos direitos fundamentais dos dois principais intervenientes de um parto: mãe e bebé.
Todos nós conhecemos histórias de cesarianas marcadas sem justificação clínica, apenas porque o médico ía de férias na data provável de parto.
Assim como conhecemos histórias de mulheres que foram “forçadas” a fazer uma indução do parto às 37 semanas, novamente sem qualquer justificação inequívoca de ordem clínica… e por aí fora.
As cesarianas, bem como todas as novas tecnologias obstétricas são muito bem vindas e necessárias… quando fazem falta.
Todos nós ficamos contentes que haja viabilidade para bebés que nascem demasiadamente prematuros e com poucas hipóteses de sobrevivência; todos nós ficamos contentes que haja tecnologia de ponta capaz de rastrear doenças in-utero e até realizar operações; todos nós ficamos contentes que uma cesariana tenha muito menos riscos associada, quando é necessário ser realizada.
Mas a tecnologia e as intervenções devem ser usadas quando são realmente necessárias, e não de forma rotineira como assistimos hoje em dia.
Não só os custos associados à assistência materno-infantil desceriam, como ressalva a Alix no seu comentário, como o grau de satisfação das mulheres seria necessariamente maior.
Para terminar, deixo-vos o link de um documento elaborado pela Organização Mundial de Saúde, sobre a assistência ao parto normal.
No capítulo “condutas claramente prejudiciais ou ineficazes e que deveriam ser eliminadas” podemos ler coisas como:

– Infusão intravenosa rotineira em trabalho de parto;

– Inserção profilática rotineira de cânula intravenosa;

– Uso rotineiro da posição supina durante o trabalho de parto;

– Uso rotineiro da posição de litotomia com ou sem estribos durante o trabalho de parto e parto.;

São tudo práticas nos nossos Hospitais nacionais, e das quais não podemos discordar, nem prescindir, muito embora a sua prática seja denominada como “claramente prejucicial” pela OMS.

Assim como podemos ler no capítulo: “Condutas que são claramente úteis e que deveriam ser encorajadas“:

– Respeitar a escolha da mãe sobre o local do parto, após ter recebido informações; Respeito ao direito da mulher à privacidade no local do parto;

– Oferecer às mulheres todas as informações e explicações que desejarem;

– Liberdade de posição e movimento durante o trabalho do parto;

– Estímulo a posições não supinas (deitadas) durante o trabalho de parto e parto.

Estas práticas são infelizmente autênticas utopias nos nossos Hospitais, embora estejam clarificadas coo “claramente úteis” pela OMS. E é por isso que não consigo compreender nem tão pouco aceitar certas práticas comuns no atendimento ao parto hospitalar em Portugal…

Não quero terminar este longo post de hoje, sem deixar uma espécie de disclaimer:
Todas as dissertações acerca deste tema são da minha inteira e exclusiva responsabilidade.
Tenho este espaço (blog), no qual partilho com os meus leitores a minha opinião acerca de vários temas, e este é mais um deles.

Irei recorrer ao tema do parto e gravidez sempre que assim o entender e se justifique, mas não quero fazer disso campanha nem tão pouco convencer ninguém. Apenas partilhar pontos de vista e opiniões :)
E agradeço a todas as que “dão a cara” nos comentários, e partilham as suas experiências e opiniões, quer sejam ou não concordantes com a minha!

26 Comments

  1. Estou grávida de 37 semanas, tive 2 internamentos num espaço de uma semana, com inicio de trabalho de parto, que acabou por não se cocretizar. Este dois internamentos deram-se no Hospital de Aveiro e na Maternidade Bissaya Barreto. A opinião com que fiquei é que ambos parecem “um cural de parideiras”…gostava de viver num pais onde a maternidade e o bem-estar das parturientes fosse mais valorizada.

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  2. Olá Rita: Fico feliz por ir lendo e relendo posts como este em que realmente se chama a atenção ao poder de escolha de cada uma. Fiz o curso pré-parto, mas tirando a respiração , nada mais me preparou para o que passei. fui fazer um C.T.G. com 37 semanas e apesar de tudo indicar estar bem, disseram que eu já não ìa sair dali, iam provocar o parto… porque já não era preciso o bebé estar lá + tempo, e eu sózinha, sem saber como recusar, ainda tentei, mas foi em vão, nem á rua me deixaram vir mais. Ocitocina e com ela as dores horriveis porque devido ao uso da mesma, a mulher é impedida de segregar as hormonas analgésicas naturais, mas quando falei nisso disseram que não fazia mal, pq ía levar epidural… a verdade é que a anestesista estava a fazer uma cesariana e assim nem as minhas hormonas nem a epidural. Conclusão, estive 24h a sofrer, já para não falar na episiotomia, desnecessária, visto que o meu bebé, era pequeno 2, 700kg ainda tinha 3 semanas na barriga para crescer, normalmente. Fico revoltada ao lembrar o dia que devia ser o mais feliz para nós. Claro que ver a carinha dele, por segundos antes de o irem lavar ( + um absurdo, pq 5 minutos ao pé da mãe, não o prejudicava em nada)foi uma enorme alegria, mas sinto que fui tratada como uma incompetente que não sabe o que fazer. A pertir daí, tento informar amigas e conhecidas, parentes que existe escolha, se o parto não for de risco. e parece que felizmente começam a olhar para estas questões com a atenção que merecem. Obrigado, e continua o bom trabalho.

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  3. Gostaria de deixar aqui a minha opinião por causa de duas coisas: primeiro porque estive em trabalho de parto à pouco mais de 4 meses e depois porque vivo na Holanda (país em que gravidez e parto são vistas de forma bastante diferente de portugal).
    Assim sendo eu tive uma gravidez normal que associada à minha idade fez com que o parto estivesse, por minha vontade, desde o primeiro dia planeado para ser um parto natural em casa (práctica frequente na holanda).
    Quando as minhas águas rebentaram foi-me informado que o parto em casa só podia acontecer se eu começasse a ter contracções nas 24h seguintes. Infelizmente isso não aconteceu e o parto acabou por ter de ser induzido dois dias depois por risco acrescido de infecção na sequência de as águas já terem rebentado.
    Ainda que não como a idealizei a minha experiência de parto foi maravilhosa. Por opção, mas também porque na Holanda são estas as práticas comuns, não levei epidural e não fui sujeita a epistomia.
    Quando comparo a minha história com a de amigas minhas que tiveram os filhos em hospitais portugueses o que mais me escandaliza é o uso generalizado de anestesias, epistomias, forceps e afins.
    Há partos e partos no sentido em que nem todas temos a sorte de poder evitar determinados “avanços medicos e tecnológicos” e claro que em situações de risco, seja ele pequeno ou grande, todas as precauções médicas devem ser tidas em conta mas, na minha opinião, seria importante, para a mulher portuguesa aprender a estar informada antes de entrar numa sala de partos de forma a perceber o que quer e saber exigi-lo. Muitas vezes determinadas prácticas são usadas para apressar ou facilitar o trabalho de parto. Não há nada pior. O parto é um momento único que exige muito trabalho e dedicação da parte da mulher. Pela minha experiência não há nada que possa ajudar mais uma mulher do que a falta de receio e medo no dar à luz.
    Eu só li um livro durante a minha gravidez (Childbirth without Fear: The Principles and Practice of Natural Childbirth) mas estou convencida que sem ele não tinha tido um parto natural, sem dor.
    Por fim a questão do parto em casa, e correndo o risco de falar de algo que nunca experenciei na pele, é pertinente e, para além de prática comum na Holanda, começa a ser usada em muitos países. A única coisa que é importante ter em conta é que este tipo de parto só é possível quando estão reunidas um numero muito específico de condições e acima de tudo quando é do desejo da mulher. É também, na minha opinião, bastante importante que durante um parto em casa o hospital mais próximo esteja de sobreaviso e que uma transferência, se necessária possa ocorrer em poucos minutos.
    Agora o que se passa nos hospitais portugueses é na grande maioria dos casos de facto escandaloso e não está de acordo com as directivas da OMS.
    Cabe às mulheres portuguesas reivindicar dos seus direitos e fazer ouvir a sua voz.

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  4. Ola Rita, so hoje descobri o teu Blog, que adorei!!
    Descobri as Doulas a cerca de 4 anos numa reportagem da revista Pais & Filhos (que tambem adoro) e posso dizer que aquela reportagem mudou a minha vida…..em primeiro lugar pk me identifico absolutamente com todas as ideologias e principios das Doulas e do Parto Natural e depois porque tinha sido mãe ha pouco tempo e este assunto tocou-me muito!
    De tal maneira que desde esse dia desejo muito fazer a formação de Doulas, coisa que ainda hei-de conseguir se deus quiser, e ajudar a mudar a mentalidade deste pais á beira mar plantado, sim pk acredito que isso passa muito pelas proprias gravidas! Quando o meu filho mais velho nasceu de parto normal no hospital Sto Andre em Leiria, lembro-me de pensar , tenho que me portar bem e fazer o que me mandarem…nada mais estupido , penso eu agora!!! Apesar disso tive um parto muito bom, isto pk acho que fui um bocadinho Doula de mim propria, estive sempre muito calma e bem mentalizada o que fez com que o meu filho nascesse calmamente mais ou menos 5h depois de ter as primeiras dores….nada mau!!
    O segundo teve que ser cesariana, pk ele estava sentado e tinha varias voltas de cordão umbilical no pescoço…enfim tinha mesmo que ser!!
    Peço descupa por este comentario tão longo , mas este é um assunto que para mim é mto importante!!
    Bjokas grandes e continua com o excelente trabalho de ajudar essas crianças a virem ao mundo tranquilamente….

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  5. Olá Sílvia!

    Muito obrigada pelo teu comentário e por teres partilhado a tua experiência pessoal, é muito importante que todas as mulheres que foram mães falem sobre a sua experiência e dêm o seu contributo :)

    Vou tentar responder à tua questão “como seria um parto destes, se fosse em casa????”

    Seria certamente muito mais fácil, e com muito menos complicações, não duvido.
    Como é que é possível?! Vou tentar explicar…
    “tive a epidural e as dores foram facilmente geridas. quando chegou a altura da expulsão, após algumas tentivas a bébé não estava a descer o canal de partos, pois estava no lado direito,”
    – O mau posicionamento do bebé acontece muitíssimas vezes em ambiente hospitalar, porque como a mulher é obrigada a estar imóvel e deitada numa cama, não é muito fácil ao bebé encaixar “da melhor maneira”, basta pensarmos que tem toda a força da gravidade contra si. Muitas das vezes bastaria que a mulher se levantasse, caminhasse um pouco, rodasse a bacia e o bebé encaixava naturalmente. Há várias técnicas de massagem utilizadas por parteiras e doulas para situações como estas.
    Provavelmente se estivesses em casa não estarias obrigada a permanecer deitada e terias liberdade de movimentos por isso haveria uma menor probabilidade de um “mau encaixe” acontecer.

    “foi-me proposto a cesariana e deixaram ao meu critério a decisão. eu escolhi continuar a tentar o parto natural. depois disso, foram utilizadas várias ajudas técnicas, as ventosas e os fórceps, e aí posso dizer que o sofrimento foi horrível. tive muitas dores e para além da episotomia ainda rasguei bem para além do previsto!”
    – Se te foi “proposto a cesariana e deixaram a decisão ao teu critério”, é porque não havia nenhum impedimento físico e patológico a que o teu bebé nascesse de parto vaginal, certo? Assim como não estava em perigo de vida… caso contrário a cesariana não seria “ao teu critério” mas sim obrigatória. O que se passou contigo, passa-se infelizmente com muitas e muitas mulheres e na maioria das vezes é resultado da posição supina (deitada de costas ou de lado), obrigatória na maioria dos Hospitais e Maternidades do país, mas desaconselhada pela OMS.
    – Há ainda outro factor muitíssimo importante no teu relato: a Epidural. A epidural aumenta em cerca de 5x a possibilidade de vir a ser necessário forceps ou ventosa, porque o afrouxamento dos ligamentos pélvicos e a própria anestesia privam a mulher de fazer força de forma conveniente. Assim como aumenta a probabilidade de ruptura perineal precisamente porque não se consegue sentir, muitas das vezes, a força que se está a fazer.
    Infelizmente, quando passam o consentimento informado às mulheres para assinarem de forma a poderem levar a anestesia epidural, não lhes falam dos efeitos secundários, e só apresentam “o lado cor de rosa”…

    Resumindo: O teu bebé nasceu de parto vaginal e saudável, mesmo depois de ter sofrido a intervenção de fórceps e ventosas. Isso quer dizer que o teu corpo É CAPAZ de parir e não precisaste de uma cesariana para o ajudar a nascer.
    Em casa tudo teria sido mais fácil, precisamente porque os factores que destabilizaram possivelmente o teu parto eram externos (protocolos hospitalares) e não problemas físicos da tua parte.
    Mesmo que em casa te sentisses desconfortável a qualquer altura (ou não conseguisses lidar com as contrações por não teres epidural à disposição) há sempre um plano B de ida para o Hospital mais próximo a qualquer altura.
    E o profissional de saúde que te acompanhasse em casa (médico ou parteira) saberia a qualquer altura avaliar a situação, de forma a levar-te para o hospital quando e se necessário.

    Espero ter ajudado a responder à tua pergunta!

    Obrigada, mais uma vez, pelo teu testemunho :)

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  6. a minha experiência é muito recente e confesso que antes do parto não pensei muito em alternativas que não o hospital público! não tinha seguro de saúde e para além disso, tive um problema de saúde durante a gravidez o que me deu direito a um acompanhamento próximo pelos serviços do hospital, pelo que não recorri mais ao médico privado.
    tinha a certeza que queria um parto natural e no hospital a política também era essa, as cesarianas só são feitas em casos mesmo necessários.
    rebentaram-me as água e fui para o hospital, sendo que passei 12 horas em dilatação, mas sempre na companhia do meu marido e num núcleo de partos com muito boas condições. tive a epidural e as dores foram facilmente geridas. quando chegou a altura da expulsão, após algumas tentivas a bébé não estava a descer o canal de partos, pois estava no lado direito, foi-me proposto a cesariana e deixaram ao meu critério a decisão. eu escolhi continuar a tentar o parto natural. depois disso, foram utilizadas várias ajudas técnicas, as ventosas e os fórceps, e aí posso dizer que o sofrimento foi horrível. tive muitas dores e para além da episotomia ainda rasguei bem para além do previsto! bem, posso dizer que depois do parto achei que nunca mais iria querer engravidar! agora acho que já me estou a “esquecer” um pouco, mas mesmo assim foi uma experiência muito dolorosa e sinceramente, se fosse hoje, teria preferido uma cesariana…
    no entanto não atribuo nenhuma culpa nem ao hospital, nem à equipa que me assistiu, que considerou sempre as minhas vontades. agora penso e pergunto, como seria um parto destes, se fosse em casa????

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  7. (rita, desculpa-me o duplo comentário)

    para a Isabel:

    é do conhecimento geral que existem, em todas as áreas e simultaneamente, excelentes profissionais e péssimos profissionais – na área da saúde incluída.

    Então, o factor sorte é determinante quando, como eu e muitas mães que aqui deixaram o seu relato, decidiram levar a sua gravidez na maior naturalidade possível, aguardando até ao expresso final do tempo para se dirigir a um hospital público e aí fazer o parto, quando o bébé quis nascer.

    Ora, se aguardei até à hora em que a minha filha quis nascer, não houve maneira de prever quem estaria de serviço no hospital a essa hora, nem se o serviço estaria sobrecarregado com outros partos, ou não.
    Deduz-se, portanto, que o médico e enfermeira que me fizeram o parto não foram escolhidos por mim, por serem bons profissionais, mas apenas porque eram as pessoas destacadas para aquela hora, naquele hospital.

    Dito isto, se eu fosse formada em matemática, e soubesse de cor a quantidade de processos em tribunal por negligência médica (que na maior parte são colocados a obstetras), conseguiria calcular a probabilidade estatística de me calhar um bom ou um mau profissional na hora do parto – ora, não tendo eu poderes divinos para controlar probabilidades estatísticas, diria que o meu destino está dependente da sorte.

    Para terminar, eu sei perfeitamente que Portugal é o país europeu com mortalidade infantil mais baixa, graças aos cuidados neo-natais. Mas o que está a ser posto em causa é o excesso de intervenções cirúrgicas em situações que não são necessárias, e não a sua qualidade.

    Uma mãe que, como eu, não inspire qualquer cuidado extra de saúde durante a gravidez, corre o grave risco de ser colocada numa linha de montagem para dar à luz.

    Se nas instituições privadas as cesarianas são mais comuns, é porque a mulher opta por esse procedimento por achar que é mais fácil (a rita conseguirá discursar melhor sobre as ideias feitas do parto que as mulheres carregam consigo), e não porque lhe é imposto. Má decisão ou não, ela teve possibilidade de escolha.

    E se a Sofia tinha dores de rins ou contracções é indiferente, porque o que interessa é que o desconforto físico ou emocional desse momento vão ser para sempre lembrados – uma mãe nunca esquece o parto de um filho e todo o esforço para o transformar num momento único é pouco e todos (mães e filhos) merecem.

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  8. Admiro o teu altruísmo neste momento tão importante/marcante na vida de qualquer mulher.
    A minha experiência:
    Durante anos vivi apavorada com a ideia do parto. Não percebia como, nos dias de hoje, ainda havia tantas situações dramáticas desencadeadas por complicações durante o mesmo e de como as mulheres sofriam atrozmente (e se partia do princípio que tinha que ser assim).
    Devido aos meus “macaquinhos no sótão”, sempre achei que não ia ter filhos.
    Até que me começaram a morrer as minhas pessoas e de repente parei para pensar que tinha chegado a altura de ponderar o assunto: se todas as mulheres conseguiam eu também havia de conseguir!
    Tive uma gravidez normal – apenas com a limitação da glicose, o que me fez ganhar pouco peso porque tinha que controlar muito bem o que comia – até às vinte e poucas semanas (a partir daí tive que abrandar), e fui seguida na Magalhães Coutinho (Estefânia) por escolha minha. Fiz preparação para o parto que considero ser essencial para um parto bem sucedido. A respiração, o controlo sobre o corpo, os princípios da amamentação. Já a instrutora era uma verdadeira besta: pessoa seca, que tratava as mães como se fossem umas irresponsáveis/indisciplinadas que muito dificilmente seriam bem sucedidas. Achei o tratamento muito desumano e inadequado mas aprendi tudo o que tinha para aprender.
    Decidi que não provocaria nunca o parto (não entendo como se faz isso por conveniência pessoal, quer do médico quer da mãe, a não ser que seja uma situação de risco). Nunca pensei que nascesse antes do tempo, como acabou por acontecer: a Alice resolveu nascer às 35 semanas. O parto durou 6 horas e meia o que, para primeiro filho é muito bom (lá está, a preparação ajudou muito), mas não me safei da episiotomia. No geral acho que fui tratada dentro do que é aceitável, não tenho queixas nem dos médicos nem das enfermeiras (a não ser de uma que disse, comigo no final do trabalho de parto, a título de piada e, passo a citar: “é bom fazê-los não é? agora aguente-se!”. No meio da dor lembro-me de pensar que a senhora devia ter sido repreendida pela médica, mas depressa percebi que deve ser a tirada normal para aqueles momentos…
    O parto hospitalar é realmente desumanizado e as mulheres são tratadas como se tivessem cometido um grande pecado e tivessem que passar pela punição, que é a dor. É tudo muito primitivo ainda.
    Tive que perder (quase) todo o meu pudor. Perdi a conta ao número de “toques” e observações que me fizeram, sempre pessoas diferentes. Não fui acompanhada pela minha médica, que só me foi ver no dia em que tive alta.
    Imagino que um parto em casa tenha todo o acompanhamento humano que um hospital não tem, mas dada a história clínica e uma vez que fiquei 6 dias sem bebé (que ficou internada na unidade neonatal), acho que na eventualidade de um bebé necessitar de assistência imediata ou quase, não há nada que chegue à certeza de que se está no sítio onde isso pode acontecer com a máxima rapidez possível.
    Se a minha gravidez tivesse chegado ao fim do tempo e tudo tivesse corrido bem, acho que gostaria muito de experimentar esta alternativa que defendes com tanto empenho.

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  9. Rita, tudo o que escreveste é muito importante para a mudança de mentalidades neste país. Os próprios médicos estão demasiado colados a uma engrenagem que visivelmente não funciona. Os seus procedimentos já são tão mecânicos que a dificuldade está em fugir deles. Eu tive dois partos, normais, hospitalares (numa clinica privada), com direito a fazer as exigência que eu achei pertinentes. Tive o pai ao meu lado, não permiti episiotomia nem estar deitada. Mas o que eu teria gostado era mesmo de ter tido um parto domiciliário. Foi minha ideia na primeira gravidez, e na segunda tive muita vontade de o fazer. Mas nunca tive o apoio e a coragem suficiente para levar a idea avante. Com muita pena minha. Se tivesse um terceiro filho fugiria com toda a certeza do soro e da obrigação de ficar deitada durante a dilatação.
    As tuas palavras são ouro!

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  10. Olá Rita!
    Tive o meu filho num hospital público por opção. No entanto, a experiência não é para repetir.

    1. Fui às urgências ao fim do dia por causa de uma perda de sangue (não era de preocupar, afinal) e internaram-me porque “estava em trabalho de parto”. Nenhum médico ligou nenhuma ao que eu disse. Não estava. Dormi toda a noite até ao dia seguinte.

    2. Fui tratada como uma esquisitinha porque ao chegar recusei a ocitocina no soro. Outra vez a mesma recusa no dia seguinte, com nova equipa de médicos – desta vez com direita a sermão (enfurecido) da chefe da equipa. Só uma enfermeira me deu apoio, nas costas da equipa médica. Resumindo: um circo!

    3. Quando finalmente nasceu o bebé mal o vi até mais de meia hora depois!!! Nem lhe toquei, nem lhe vi a carinha. Nada. Esta, para mim, é imperdoável e a pior de todas. Eu cá fora no corredor com um copo de leite na mão e ele a chorar no berçário embrulhadinho em mantas…

    4. Ajuda no pós parto = zero. Até me chegaram a dar aero-om para a mão porque “o mal dele são cólicas”! Com menos de 24h de vida. O mal dele era fome. Era só isso. Eu é que estava toldada pelo cansaço e tinha a impressão que ele tinha acabado de mamar… e já lá iam 2h.

    Foi mau. Não vou repetir. Gostava muito de um parto em casa, sim. Mas já me contentava com um hospital onde ouvissem as pessoas.

    Beijinhos e parabéns pelo teu belíssimo trabalho!

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  11. Sim à liberdade (informada) de escolha!

    Também gosto muito destes teus posts sobre a gravidez e os partos.
    Além de que a fotografia com que ilustraste este post é linda :)

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  12. Rita, estou grávida de 27 semanas (seis meses e meio…) e sou mãe de um rapaz com 8 anos, que nasceu num hospital público às 41 semanas, por cesariana, depois de horas de sofrimento e quando finalmente a equipa médica percebeu que ele não iria passar de forma alguma. Tinha 4.250 e 54 cm o meu filho.
    Ainda que tivesse 3 kg, ao que parece não passaria pela via normal. O que me traumatizou foi precisamente o lado (de)humano da coisa. No parto, como nos dias anteriores em que ia lá fazer registos. A médica que me acompnhou durante a gravidez foi de férias e não estava lá quando mais precisava dela. Não era dos cuidados médicos, acho eu. Era da pessoa que tinha ouvido em 9 meses todas as minhas dúvidas, angústias, medos. Talvez por isso, a primeira coisa que fiz quando pensei engravidar de novo (não imaginava que iria demorar 5 anos a consegui-lo…) foi procurar um médico que me garabntisse acompnhar-me naquela hora. Porque sim, esse acompnhamento é fundamental. E por isso tenho andado a ler com atenção muito sobre as doulas. Gostei do teu post, um beijo

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  13. Este blog é da Rita e não meu mas

    Alice, acha mal se acha que vai melhor para uma clinica privada, em geral os partos induzidos e as cesarianas porque sim são aí mais comuns, o que tem de melhor é a hotelaria.

    Sofia, as contracções são muitas vezes percepcionadas como dores de rins e não, não faça logo uma cesariana só porque não quer passar pela dilatação.

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  14. aquilo que me assusta, e pela minha experiência pessoal, é que sei que o facto de correr tudo bem num hospital, seguindo os procedimentos médicos estipulados, é pura sorte.

    Isso não é verdade, Alice, um parto num hospital em Portugal do ponto de vista da saude fisica do bebé e da saude fisica da mãe corre normalmente bem, temos das taxas mais baixas de morte à nascença e de mortalidade infantil o nº de crianças com parilisia infantil decorrente do parto diminuiu drasticamente, justiça seja feita ao bom acompanhamento das grávidas e dos partos. A parte humana é mais complicada e infelizmente não é apanágio da obstetricia mas da medicina em geral.

    A mim sobretudo arrepiam-me as cesarianas inuteis e os partos induzidos e as mães que ainda se consideram muito bem tratadas assim.

    Escrevi há uns anos para um blog de doulas, que não sei se ainda existe a relatar os meus 3 partos: os meus 3 filhos nasceram na Maternidade Daniel de Matos em Coimbra, tive total liberdade de movimentos até ir para a sala de partos, podia passear pela maternidade toda se assim me apetecesse. Tive sempre o meu marido ao pé de mim e dos dois primeiros até uma tia. Os médicos e enfermeiros na sala de partos foram super (e não me conheciam anteriormente) e do terceiro as médicas, muito novas estavam cheias de vontade de fazer um parto natural mas no fim tiveram (?) que fazer um pequeno corte, todos os meus filhos nasceram muito grandes.

    Tenho imenso respeito por quem acompanha as mulheres nestas alturas, pela disponibilidade, pelo altruismo, por querer melhorar as coisas e imensa admiração por quem escolhe conscientemente ter os filhos em casa, porque eu não conseguiria.

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  15. Gostei de ler Rita. Não costumo comentar no teu blog apesar de o ler, mas hoje decidi deixar o meu testemunho.
    Tive o meu filho há 2 anos num hospital público, por opção. Tenho seguro de saúde mas ainda assim preferi o hospital (São João). Às 24 semanas estive internada 1 semana por causa da colestase e estava em pánico porque o bebé poderia ter que nascer mais cedo. Na altura as enfermeiras que me acompanharam foram do melhor que há.
    Correu tudo bem e o Joao nasceu às 39 semanas, sem stress, comecei a ter as dores ás 12h, falei com a minha médica que me seguiu e estava de serviço nesse dia. Fui internada às 18h e o João nasceu às 23h14. Estive sempre acompanhada pelo meu marido.
    Optei por frequentar um curso de preparação para o parto que hoje considero FUNDAMENTAL para qualquer mulher grávida. Saber para o que vai, aprender a controlar-se com a respiração, poder partilhar com outras futuras mamas todas as suas dúvidas e aprender da experencia das parteiras….
    Só desejo que do próximo seja tudo igual.
    Só mais uma coisa: no tempo de internamento pós parto as enfermeiras faziam de tudo para ajudar e estimular as mães a amamentar os filhos.
    Eu amamentei até aos 17 meses :))

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  16. Olá Rita,
    Concordo plenamente com a tua opinião, embora ache que nunca teria um filho em casa por não me sentir segura, e talvez também porque felizmente o meu único parto (até agora) correu muito bem! Tive a Marta há 2 anos no Hospital São Francisco Xavier, sem epidural (porque assim decidi e porque quando decidi o contrário já não podia ser porque já estava na altura de fazer força). O marido esteve sempre do meu lado, as enfermeiras foram umas queridas e a enfermeira parteria que me me acompanhou foi impecável! Já no quarto, tanto eu como a Marta tivémos sempre a atenção necessária! Julgo que tudo correu muito bem porque também fizémos um curso de preparação para o parto com uma fisioterapeuta espectacular que nos ensinou muita coisa sobre o parto e sobre como cuidar do nosso bebé antes e depois de nascer! Fiquei sempre com vontade de repetir a experiência dado o facto de tudo ter corrido de uma forma tão boa. Só não gostei de uma coisa: fiquei com um quarto sem vista para o Rio Tejo… da próxima vez quero um com vista… :)

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  17. Olá Rita, acho bem que se fale de alternativas ao “parto-tipo-tortura-anestesiada” de que algumas amigas me contaram que passaram em Portugal, provávelmente elas nem conheciam essa alternativa …
    Mas não penso que a alternativa seja forçosamente casa versus hospital porque o que seria preciso era “reformar” o parto no hospital, as doulas não podem por ex ter um papel activo no meio hospitalar para quem prefere assim?
    eu tive os meus filhos num hospital em Bruxelas onde o parto era “à la carte” : na água ou não, com massagens, sem massagens etc . Eu escolhi a versão clássica mas quem me seguiu era uma parteira, e a música de fundo era também clássica ;-)

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  18. acho que explicaste tudo :)

    aquilo que me assusta, e pela minha experiência pessoal, é que sei que o facto de correr tudo bem num hospital, seguindo os procedimentos médicos estipulados, é pura sorte.
    É sorte se tiver pessoal simpático, é sorte se em vez de ser num hospital público, conseguir pagar uma maternidade privada com direito a exigir tudo. O dinheiro ainda decide muita coisa neste país.

    Acho que ninguém quer que o factor ‘sorte’ seja decisivo na altura do parto.

    Eu tive um parto no hospital que correu bem, porque: recusei-me a induzir o parto 2 semanas antes (quando me foi proposto), porque quem fez o parto foi alguém conhecido ( a sorte novamente ), e porque não havia mais ninguém a dar à luz na maternidade do hospital e portanto tive toda a atenção.

    Da próxima: não aceitava epiosotomia.
    Não aceitava que o pai não assistisse ao parto.
    Não aceitava TER de ficar completamente sozinha no hospital após o parto, sem ninguém, a meio da noite, e durante os próximos 3 dias.
    Dispensava os conselhos arbitrários de enfermeiras e auxiliares ressentidas e a contínua falta de apoio nesses dias.

    Queria ter tido um acompanhamento imparcial e próximo, que me ajudasse a tomar as decisões mais difíceis antes do parto, na hora do parto e no início da maternidade, porque ainda hoje atribuo à minha falta de informação e pressão de outras entidades, a culpa de não ter conseguido amamentar tempo suficiente.

    Resumindo, o que eu queria era que em Portugal tivéssemos a liberdade de escolha como há no Reino Unido, tal qual como disse a Alix.

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  19. História…

    *Out./91 nasce o R. depois d 48hs em sofrimento. Nessa data houve um boom de bebés na Estefânia (antiga), as mães tinham de “apertar” tudo para que os coitados só podessem nascer quando a sala estivesse vazia!

    *Jul/95 nasceram os gémeos e foi tudo muito mais calmo e aproximado do “natural” de outros tempos. O P. nasceu primeiro e o A. logo a seguir… estava sentado e as massagens na barriga fizeram-no dar a volta.

    *Març/01 foi a vez da A., correu tudo tão bem, até ao momento de me despacharem para casa. Sendo mãe há mais tempo acharam que não precisava de tantos cuidados.

    Fev./02 A G. foi muito complicada!
    Placenta Prévia, até o nome assusta!
    Hemorregias constantes, daquelas em que se abre torneiras e o sangue sai a litros!
    Dias a fio sempre deitada em repouso absoluto… terminando mês e meio antes do tempo numa cesariana (dita obrigatória nestes casos). Algo que eu achei frio e desprovido de sentimento.
    O pior veio depois. Anestesia geral que me deixou quase dois anos em amnésia… chegando ao ponto de não me lembrar que a porta de casa era num 3º andar e não no primeiro, entre outros episódios. Mas infelismente neste caso, tinha de ser assim.

    Sou a favor de um parto natural, sem objectos em ferro, sem bisturis e agulhas.

    E aquilo que escreves não é campanha mas sim informação util para quem é ou pretende dar a luz o seu bebé.
    Importante e saber que uma mãe deveria ter todos os direitos de escolha no acto mais belo que é este de ser MÃE.

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  20. eu gostava de num próximo parto poder ser acompanhada de uma forma diferente e de poder escolher qual a melhor posição para eu suportar as dres em vez de me obrigarem a estar ali 14 horas seguidas na mesma posição como me acontceu a mim, já tinha mais dores de costas e rins do que as das contracções, isto é mesmo verdade. De tão mal que correu ( e terminou em cesariana) estou em panico com um proximo parto e já fiz um seguro de saude para poder marcar logo uma cesariana e não ter de passar por o mesmo. Mas no fundo o que eu queria mesmo era um parto natural com um bom acompanhamento (mas num hospital, porque em casa nunca me sentiria segura).

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  21. Apesar de mto longe de pensar sequer ter um bébé, gosto muito de ler o que escreves sobre o tema. É bastante interessante e esclarecedor. Além de falares de coisas provavelmente desconhecidas de muitas mulheres mães ou não. Obrigada. :)

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