Semana Mundial pelo Parto Respeitado – Humanização

women power, originally uploaded by “Gayatri”.

Celebra-se esta semana, entre 12 e 18 de Maio, a “Semana Mundial pelo Parto Respeitado”.

No ano passado o tema foi as intervenções desnecessárias, e este ano o tema é a separação prejudicial Mãe/bebé.

No entanto, esta é uma semana que pretende chamar a atenção para as questões relacionadas com a gravidez e o parto, permitindo discussões transdisciplinares.

A Humanização do parto é um tema em voga hoje em dia, mas afinal de contas, o que isso de “Humanizar o Parto”?…

Para a maioria dos médicos e directores de serviço, humanizar o parto é ter melhores condições e conforto para as parturientes, permitir-lhes um acompanhante durante o trabalho de parto, ter um atendimento mais gentil e simpático.

Nesse seguimento, temos várias maternidades do país a dotarem-se de infra-estruturas mais modernas, muitas delas até com a opção de quartos individuais onde a mulher pode parir em maior conforto e privacidade.

Por outro lado, a epidural é hoje uma realidade na larga maioria dos serviços de obstetrícia, e em muitos deles é administrada logo no inicio do trabalho de parto, mesmo sem que a mulher a tenha requisitado expressamente, sendo também este um indicador de humanização dos serviços na óptica dos médicos.

Muitos hospitais publicitam o seu serviço de obstetrícia como promovendo o “parto sem dor”, quando na verdade o que oferecem é uma taxa de epidural acima dos 90%.

Quando questionados em relação aos procedimentos protocolares, a maioria deles contrária às indicações da OMS, os médicos são peremptórios a afirmar que todos eles são absolutamente necessários, que o que fazem é em nome da suprema segurança da mãe e bebé, que um parto é sempre um risco, e que há que usar a tecnologia ao alcance para o minorar e de certa forma “controlar”.

Mas será isto a humanização do parto e nascimento? Hospitais mais bonitos e arejados, bem como enfermeiras simpáticas e atenciosas?

Não me parece que seja… Por muito que seja desejável que as Maternidades se tornem cada vez mais em sítios agradáveis (na medida das possibilidades) e que as enfermeiras e demais trabalhadores das unidades sejam simpáticos e atenciosos, humanizar não é nem pode ser distribuir sorrisos bonitos enquanto se fazem intervenções desnecessárias e não se dá a possibilidade às mulheres de escolherem como querem o seu parto.

Humanizar o parto, segundo a maioria dos activistas desta causa, é a devolução do protagonismo às mulheres.

Humanizar o parto é dar voz às mulheres e colocá-las na hierarquia do acontecimento, é saber quais são os seus anseios, desejos e medos para o acontecimento mais marcante das suas vidas.

É ouvir a sua opinião e respeitar as suas escolhas, é dar-lhes informação, para que possam tomar as suas decisões de forma consciente e informada.

Nesta maneira de ver a humanização, ela tanto pode acontecer quando se respeita e apoia a vontade de uma mulheres de parir em casa, como quando se respeita e apoia a vontade de uma mulher em ter um cesariana programada sem ter qualquer indicação médica para tal.

Enquanto que o primeiro quadro (parir em casa) ainda é visto por muitos como um acto de loucura irreflectido, pondo em causa a sua saúde e segurança, bem como a do bebé, o segundo quadro (cesariana programada) é muito comum hoje em dia e completamente aceite quer pela opinião pública quer pelos médicos, embora comporte mais riscos para a saúde tanto da mãe como do bebé…

E porque é que assim acontece? Principalmente porque a obstetrícia moderna não vê o parto como um acto natural e fisiológico, mas sim como um grande risco para o organismo feminino, e consequentemente para o bebé, que precisa ser monitorizado, controlado e intervencionado por fim a ter um resultado feliz e satisfatório.

O Obstetra francês Michel Odent chega mesmo a dizer que o que é preciso não é “Humanizar o parto”, mas sim “Desumanizar ou Mamiferalizar” o parto. Ele defende que quanto menor for a intervenção humana, melhor. E que só se deve lançar mão de evoluções tecnológicas em casos de partos realmente complicados, opinião muito criticada pela maioria dos seus colegas…

Por trás dos modelos actuais de assistência ao parto, está a ideia de que a mulher não está em condições de decidir sobre o que é melhor para si e para o seu bebé, que precisa de se sujeitar às decisões tomadas por um médico, simbólica e hierarquicamente superior a si própria.

Dar voz às mulheres, educá-las, informá-las, ainda é visto por muitos especialistas como uma tarefa desnecessária, dado que só eles sabem o que é melhor para elas e para o seu parto. Por outro lado, mulheres informadas, que tentam lutar pelos seus direitos, são vistas como perigosas e de certa forma subversivas, precisamente porque põem em causa os procedimentos e protocolos, ameaçando directamente a hierarquia vigente.

A informação e a educação das pessoas sempre foi vista como perigosa ao longo da história, e por isso em muitas situações as pessoas são mantidas na ignorância para que outros possam decidir por elas.

A humanização passa por informar as mulheres, e voltar a encarar o parto como um acontecimento natural/fisiológico e do domínio do feminino, ideia em si demasiado perigosa numa sociedade mecanizada e paternalista.

O tema só agora começa a ser debatido em Portugal, com bastante descrédito (infelizmente) por parte da classe médica vigente. Seria importante que todos percebessem que este é um tema que tem percorrido todas as sociedades ocidentais e industrializadas, e que a vontade de as pessoas o debaterem se prende com o facto de não estarem satisfeitas com os modelos vigentes.

Fechar os olhos e as portas ao diálogo, insistindo na necessidade imperativa da medicalização do parto, só promove o afastamento e a crispação, em vez de contribuir para um diálogo construtivo e alargado.

A Humanização do Parto e Nascimento não é possível com mulheres caladas e sem voz. São elas que têm de lutar pelo seu direito à informação e auto-determinação.

O caminho não é voltar as costas aos avanços científicos e criar guerras desnecessárias, mas sim dialogar de forma abrangente e livre, colocando as mulheres no centro de toda a questão, dando-lhes toda a informação possível para que possam decidir de forma segura, se acordo com as suas crenças e concepções morais.

6 Comments

  1. Rita,
    Também tenho quatro filhos (menina-14 anos, menina-10 anos, menina-5anos e menino-2anos no próximo dia 29).
    Fizeram em mim 4 cezarianas. Chorei na primeira quando o médico me avisou, numa consulta de rotina, que faria a cezárea naquele mesmo dia. Não esperaria mais. A idade gestacional era incerta. Eu não sentia nada. Até hoje não sei se estaria arriscando se esperasse mais. Eu estava vulnerável. Havia “me preparado” para o parto normal, mas acho que não tanto… Tinha um certo medo da dor. Acho que fui covarde. Aceitei passivamente…
    Os demais partos cezáreos decorreram deste primeiro. O segundo foi com o mesmo médico, por vários motivos circustanciais. Fui passiva novamente.
    Mas felizmente deu tudo certo, pelo menos até onde sei. Meus filhos são saudáveis e eu… será que tive algum prejuízo físico decorrente desta situação? Isto é o que não sei.

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  2. Que lindas fotos Rita, quem consegue gerar dentro de si um filho, carrega-lo enquanto se alimenta do seu corpo… tambem deve confiar no seu corpo – POWER!

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  3. Subscrevo o que diz, Rita. Infelizmente, há médicos a fazerem consultas domiciliárias em quase todas as especialidades, mas obstetras ainda não encontrei nenhum… fico na esperança de ainda descobrir algum(a)…

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  4. Obrigada Rita por contribuir para a minha educação. Todas as informações relativas aos vários pontes de vista são importantes para uma decisão em consciência. Sabe bem passar por aqui ;)

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  5. …e lembrar que parir é mais do que um acto médico, é um acto de amor!
    (como se ainda houvesse algo para dizer, depois deste magnífico texto…)

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