Semana Mundial Pelo Parto Respeitado – 2009

(imagem da campanha da Associação Argentina Dando à Luz )

A semana mundial pelo parto respeitado já começou na segunda feira e prolonga-se até dia 17.
Por falta de tempo, e com grande pena minha, acreditem, só hoje volto a escrever sobre estes temas.
Tenho sempre muito que dizer, e a minha dificuldade na maioria das vezes é escolher o tema concreto sobre o qual dissertar, no que à humanização do parto diz respeito, porque tudo me motiva imenso a escrever.
Volto a lançar o desafio aos meus leitores, tal como já fiz o ano passado, que me digam nos comentários sobre o que gostavam que eu escrevesse. Conto com as vossas sugestões para os temas desta semana!

Para dar o mote à, deixo-vos a reportagem feita pela SIC, um trabalho da Jornalista Manuela Vicêncio, que foi transmitida no dia da mãe. Não é possível colocar aqui o video, por isso tenho de deixar o link para o mesmo na página da Sic Online:

http://www.sic.pt/online/video/informacao/Reportagem+SIC/2009/5/9-meses-depois.htm

A reportagem da deixou-me, de forma geral, bastante satisfeita. Foi o primeiro trabalho do género feito em Portugal e sobre a nossa realidade e acho de não defraudou as expectativas. Foi incisivo o suficiente, não cortou prestações menos brilhantes, recolheu opiniões médicas divergentes, fugiu ao sensacionalismo e abordou transversalmente a questão. Toda a equipa está de parabéns, porque é um trabalho sério e bem apresentado.

Para mim, foi difícil distanciar-me do documentário, até porque muitas das pessoas presentes eu conheço-as do dia a dia e da defesa desta causa comum – a humanização do parto..

Em relação aos intervenientes:

O Prof. Jorge Branco, da MAC, esteve brilhante, como sempre, aliás.
Tenho uma grande estima e consideração pessoal por ele, sei bem que não foi fácil implementar as mudanças que hoje existem na MAC (são poucas, é certo, mas é um princípio importante e é sempre necessários começar por algum lado – roma e pavia não se fizeram num dia), nem tão pouco é fácil enfrentar a resistência a oposição dos colegas de profissão.
Mas é um homem coerente, informado e muito ponderado. É uma mais valia para o país, sem dúvida.
De realçar do discurso dele:

“Todas as semanas se usa (o quarto com a roda de partos), mas não é muito procurado. Repare: o médicos e as enfermeiras que assistem partos nesta sala têm que se por na posição que a senhora gosta e não na posição que eles gostam, e portanto não é – digamos – o mais oferecido…”

“Há uma grande pressão por parte dos médicos é verdade, muita pressão por parte também das mulheres, que querem parto induzidos, sem indicações clínicas. Há induções feitas intempestivamente, sem que o colo esteja preparado para isso, e é claro que essas induções acabam sempre mal e é muito provável que acabem numa cesariana. Para mim essa é a principal razão pelo disparo das cesarianas.”

“O parto em Portugal é no Hospital, embora seja bom que a pouco e pouco o consigamos desmedicalizar, pelo menos no que diz respeito aos seus exageros.”

A Enfª Lúcia Leite – igual a ela própria. Uma mulher de fibra e convicção a defender aquilo em que acredita e no qual trabalha diariamente há mais de 20 anos:
“quando uma mulher se sujeita a uma epidural, essa situação leva-a muitas vezes a outras situações indesejadas e muitas vezes o desconforto ou até sofrimento do feto.”

Mary Zwart – é uma mulher que tive o privilégio de conhecer há 3 anos, no primeiro congresso da HUMPAR. Além de ser um ser humano extraordinário é uma parteira com muitos anos de experiência, em que se confia automaticamente. Uma mulher muito interessante:

“se pensarmos no ambiente para dar à luz, é o resultado da nossa vida sexual. Tem a ver com as cores, os cheiros, a forma como nos movimentamos, A maneira como se tem acesso a comida e bebida – tudo isso contribui imenso.
Como o Dr. Marsden Wager disse uma vez: se pedíssemos a homem para ter relações sexuais no mesmo ambiente em que uma mulher ó obrigada a parir, ele recusar-se-ía ou teria muita dificuldade em conseguir uma erecção…”

Adorei a Ana a falar do seu parto e da dor de parto, a metáfora não podia ter sido mais feliz:
“Claro que custa, claro que é assoberbante, mas faz parte. As pessoas tb não querem uma epidural para deixar de sofrer de amor, uma epidural para corações partidos. Há coisas que temos de sentir:”

Hospital de São João:
É um dos sítios em Portugal que mais aberto está para a mudança do atendimento ao parto.
Na minha opinião, foi retratado apenas pela negativa e a profissional dos “macaquinhos” descredibilizou toda uma equipa que sei ser dedicada e empenhada…

A Dr.ª Marina Mocho esteve bem – é médica, está a defender a sua profissão e os seus pares – mas mesmo assim consegue ser cordial e mostrar abertura q.b. apesar de ser estar convicta de que a mulher não tem que dar a sua opinião:

“Acho que a maioria da população portuguesa confia plenamente nos cuidados que vai ter e por isso não está muito importada em dar a sua opinião ou não, até porque acha que vamos decidir por ela, e provavelmente vamos decidir bem…”

(Atrevo-me aqui a dizer que o problema da saúde em Portugal tem a ver com esta prepotência dos médicos, que acham que sabem tudo, que não têm de perguntar nada a ninguém e que as pessoas não são vistas nem achadas naquilo que lhes diz respeito – a sua saúde e bem-estar)

Outra questão muito importante que foi abordada de forma subreptícia: Todos os procedimentos médicos têm de ser autorizados pela mulher, cesarianas e epidurais. É suposto a mulher assinar um consentimento informado onde é esclarecida dos prós e contras das intervenções e assume responsabilidade pelas mesmas. A verdade é que a maioria desses “consentimentos” são assinados literalmente às cegas. O que transcrevo faz parte de um diálogo entre médica e paciente no Hospital de S. João, visível no documentário:
“- Consegue assinar?
– Estou a tremer…
– Não faz mal, não se preocupe… faça uma coisa qualquer.

(palavras para quê…)

Drª Libânia Araújo – mais conhecida como a “médica do macaquinhos”:
Foi a primeira vez que ouvi e vi esta senhora e confesso que tenho verdadeira curiosidade em conhecê-la. Teria todo o gosto em explicar-lhe, entre tantas outras coisas, que os macacos são tão ou mais inteligentes do que nós, que partilhamos mais de 90% do código genético com eles, e que temos aprendido muito a estudá-los. Não são uma “coisa” esquisita e bizarra que se visita no Jardim Zoológico atrás de uma jaula.
Teria ainda todo o gosto em falar com ela acerca outras coisas, como explicar-lhe o conceito de “humanização do parto” e dar-lhe a conhecer a Teoria Humanista do séc. XV que visava exaltar uma série de valores e ideiais relacionados com o ser humano, que não tem nada a ver com “macaquinhos”, sejam eles do nariz ou do chinês…

O que transcrevo de seguida não é um monólogo surreal que acabei de inventar, mas sim a transcrição ipsis verbis da contribuição da senhora para o documentário:
“- Respeitamos as mulheres tanto quanto é possível. Eu só posso respeitar a vontade da mulher enquanto não corre nenhum risco – nem a saúde da mulher nem a saúde do filho. Quando alguma dessas variáveis corre algum risco, eu não posso respeitar.
Eu detesto a palavra humanização: porque até parece que estamo aqui a ter macaquinhas a ter partos e não, nós temos mesmo pessoas!
A medicina não é veterinária, portanto eu não vou humanizar aquilo que já está humanizado: uma mulher, um homem, uma criança, são seres humanos. Portanto eu não vou mais humanizá-la. É um pleonasmo que eu na verdade não gosto. Percebo a ideia mas apetece-me perguntar quantos macaquinhos humanizamos por mês, ou por semana…

Com médicos assim, prefiro um tratador de macacos!!

Enfim, vejam vocês o documentário, se é que não o viram já, divulguem, comentem, mexam no assunto!
E deixem sugestões em relação aos temas que gostavam de ver abordados esta semana. Vou-me esforçar para corresponder e postar com a regularidade necessária :)

12 Comments

  1. Eu entendi o que a Dra. Libânia Arújo quis dizer e, sinceramente, acho que estás a fazer a TUA leitura… Não devemos ser radicais nas leituras que fazemos das coisas só porque somos radicais nas nossas visões…

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  2. Querida Zé!
    Muito obrigada pelo teu testemunho!
    Tenho muito orgulho de ser tua amiga e de ter acompanhado o teu percurso!
    És sempre bem-vinda a este espaço e se um dia quiseres aqui divulgar o teu relato de parto, terei a maior honra em publicá-lo :)

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    1. Rita,

      deixas-me sem palavras com as tuas palavras ;)

      Obrigada por fazeres parte do meu percurso amiga!

      Até breve com as linhas e os trapos!

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  3. Tive uma bébé há 2 meses num parto lindo em casa acompanhada pela Parteira Mary e pela minha amiga doula Ana. Foi uma experiência muito positiva e transformadora!

    Para a Umademim, tenho três filhas. A 1ª nasceu de cesariana com epidural por suposta incompatibilidade feto-pélvica. A 2ª nasceu de parto normal na maternidade e a 3ª nasceu em casa. O que mudou da 1ª para a 2ª e como consegui o meu VBAC (vaginal birth after cesarean)? Acreditando que era capaz de parir, confiando no meu corpo! é Possivel! Há muitas histórias bonitas de VBAC.

    Rita, obrigada por trazeres estes temas ao teu espaço de partilha cibernética. Beijinhos e saudades!

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  4. Tive um parto induzido por não desenvolvimento da minha bebe, após 19h em trabalho de parto e sem 1 único dedo de dilatação teve que ser cesariana.
    A verdade é que confio muito no meu médico e sei que foi a melhor opção tanto para mim como para a minha filha e a única coisa que interessa na verdade é que estamos bem.

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  5. olá rita,

    ainda bem que essa reportagem passou mas ainda há muito a fazer para mexer com ideias instituídas na cabeça das mães e de profissionais de saúde. fiz infelizmente uma cesariana às 40 semanas. a questão que queria pôr é a seguinte. em que medida poderei ajudar o meu corpo, numa hipotética segunda gravidez, a evitar uma segunda cesariana?

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  6. Olá Rita,

    Tenho assistido com muito interesse a todas as questões que tem lançado sobre a maternidade, tal como ela é realizada em Portugal. Resolvi comentar pela primeira vez porque gostava de a ouvir sobre uma matéria que me parece particularmente importante e que poderia ser o início de uma maior sensibilização por parte dos nossos hospitais, ou blocos de parto. Não lhe parece que a posição do parto pode ser determinante no sucesso do processo do nascimento? Mais do que discutirmos epidurais ou excesso de cessarianas (com toda a propriedade, claro!), não deviamos trabalhar para que as equipas médicas fossem mais sensíveis à forma como a mulher está posicionada durante o trabalho de parto? É que obrigar uma futura mãe a estar deitada durante a dilatação e a fazer o trabalho de expulsão deitada parece-me o mais anti-natura possivel e concerteza que prejudicará o desenrolar do processo. Será que o trabalho de sensibilização em Portugal não deveria começar por aí? Senão, mais vale ser ‘macaquinha’!!!

    Obrigada e parabéns por tudo o que expõe no seu blogue!

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  7. Olá Rita!

    Antes de mais parabéns pelo Blog, pois já é uma das minhas visitas diárias. Confesso que este é um tema que também gosto de debater, principalmente porque fui mãe há pouco mais de 1 ano e vivenciei um parto hospitalar.
    Por ter uma gravidez de risco (hipertensão crónica) fui seguida durante a gravidez no hospital, às 36 semanas fiz diabetes gestacional e às 38 semanas queriam-me induzir o parto e… eu não deixei.
    Vi a médica a decidir a minha vida sem me explicar nada nem me perguntar nada e recusei-me, tinha feito uma ecografia nessa semana e a bebé ainda não tinha grande peso, mas as minhas tensões estavam controladas. Induzir para quê?
    Foi então induzido, mas às 40 semanas. Muita caminhada para fazer a dilatação, mas não saía dos 2 dedos. Induziram-me às 13.00h e a Inês nasceu de parto normal (com epidural) às 23.55h. Fiz bem a dilatação, mas estava com medo que terminasse numa cesariana, o que não aconteceu, acabei por recorrer à epidural, o que inicialmente achava que não iria fazer, mas correu tudo bem.
    O ideal para mim era ter tido um parto que decorresse espontâneamente e em casa, mas não encontrei apoio da família e tinha a insegurança que devido à hipertensão fosse correr mal. Acho que fiz a melhor opção. A Inês nasceu com bom peso e mamou na sala de partos. Foi lindo!
    Acho que devemos fazer-nos ouvir e que respeitem as nossas decisões, se houvesse de facto um risco clínico teriam-me induzido às 38 semanas,nasceu de parto induzido de facto, mas às 40 e estava óptima. A informação é que nos dá poder de decisão.
    Jinhos!
    Susana

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  8. gostei muito do documentário – mostra uma realidade que não conhecia.

    Ainda não o tinha visto na tv nem na net – obrigada por divulgares!

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  9. vi a reportagem quando passou e gostei bastante. lembro-me de também ter ficado com a história dos macaquinhos na cabeça. Percebo o que ela quer dizer, parece um pleunásmo, humanizar aquilo uqe já é humano, não lhe calhou bem. certamente será uma boa médica, acreditemos que sim, que é daquelas que nao tolera as lamechices que algumas grávidas assumem. Prefiro o humanizado, concluindo. Gostei do teu post, assim como outros que tens feito. refiro-te no meu blog, continua!

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  10. Ainda estou boquiaberta com a médica dos macaquinhos!
    acabei de ver o documentário e ainda não acredito!!
    Como é que uma criatura assim pode ser médica…

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