a reciclagem de ganga continua.
iniciei este projeto de reciclar gangas no início do ano. a ideia é fazer, ao longo do ano, várias peças utilitárias em que a ganga seja a principal matéria prima.
uma manta grande, 4 almofadas e várias coleções de sacos: é o balanço até agora.
ao longo destes meses tenho aprendido muita coisa com este material, e tenho-me apercebido de várias coisas, que gostava de partilhar convosco…
fala-se muito de “fast fashion” e das grandes lojas de roupa que vendem peças a preços completamente impensáveis, se tivermos em conta o custo mínimo de produção de uma peça de vestuário. a verdade é que na indústria da moda cada vez mais se apela ao consumo irrefletido e desnecessário. quem não tem pelo menos um par de peças de vestuário no armário que nunca usou ou usou apenas uma vez e colocou de lado?… quem nunca comprou uma peça de roupa por impulso, a reboque do preço ridiculamente baixo, e depois raramente a usou?… todos estes comportamentos têm consequências.
consequências para nós, em primeiro lugar, que acabamos por ter armários cheios de roupa que raramente usamos e gastamos dinheiro em várias peças de qualidade medíocre , em vez de gastar a mesma quantidade numa única peça boa e mais durável.
consequências para o mercado de trabalho e as condições dos trabalhadores têxteis, porque os preços baixos na etiqueta de uma camisola são resultado direto dos baixos salários pagos a quem a faz e lucros astronómicos de quem gere a empresa.
consequências para o ambiente, porque todo o desperdício têxtil (e por desperdício têxtil leia-se a quantidade de roupa que vai parar no caixote do lixo) começa a ser um problema ambiental, e porque o transporte de toda esta quantidade de mercadoria “descartável” e em constante renovação tem custos e deixa uma pegada ecológica demasiado difícil de compensar.
nas gangas, tenho reparado numa série de coisas “interessantes”…
apesar de ser um tecido tradicionalmente robusto (quer dizer, as calças de ganga foram inventadas como roupa de trabalho…), há várias marcas em que o tecido se parece com tudo menos com ganga. nota-se que é um tecido de fraca qualiade e sem a mínima intenção de ser durável. curiosamente, ou não, são precisamente as marcadas de “fast-fashion” que têm este tipo de calças. tenho trabalhado com calças com um ou dois anos de uso, que estão absolutamente impróprias para vestir.
as marcas “clássicas”, que toda a vida nos habituámos a a ver associadas a calças de ganga, têm tecidos realmente robustos (as agulhas da minha máquina que o digam!…).
tenho trabalhado calças com várias dezenas de anos que mantêm a robustez inicial do tecido, muitas delas sem nenhum buraquinho ou desgaste maior.
chegamos mais uma vez ao conceito de consumo rápido: no meu tempo não havia calças de ganga “baratas”. havia calças de ganga de marca, mais ou menos cara, e juntava-se dinheiro para comprar um par (com alguma sorte, dois) que nos íam durar literalmente uma vida inteira. os modelos eram clássicos e intemporais e cada um de nós tinha a sua marca favorita, sendo um fatores de eleição o corte das calças. ainda hoje tenho calças que comprei com 15/20 anos. as que não uso, é por já não caber nelas.
hoje em dia temos centenas de modelos de calças de ganga, que variam ao sabor das modas: ora se usa a cintura descaída ora cintura subida, ora se usam as calças à boca de sino, como a seguir o que está na moda são as calças skinny.
no meio desta esquizofrenia de “modas”, o mercado rejubila: a cada estação reinvemtam-se as calças de ganga. de tal maneira, que acabamos por nem perceber que as calças que nos custaram tão pouco dinheiro não foram feitas para durar, como antigamente. e como na estação seguinte se usa outro modelo diferente daquele que temos no armário, acabamos por encostar as calças no fundo da gaveta e compramos umas novas.
como consumidores, cabe-nos a nós por um ponto final nesta espiral de consumo desenfreado e sermos cada vez mais críticos naquilo que compramos. perceber que o nosso poder é mesmo a nossa capacidade de decidir onde gastamos.
acerca do assunto, e para ajudar a pensar neste tema polémico e complexo, recomendo o documentário “The True Cost”:
o meu projeto de gangas recicladas vai continuar ao longo do ano, e enquanto tiver matéria-prima. é o meu contributo para fazer coisas bonitas a partir de coisas feias :)
depois dos sacos em patchwork de ganga e dos sacos Frida Kahlo, na semana passada terminei uma nova coleção.
são também em patchwork, mas são maiores. em vez de ser um saco para o dia-a-dia, como os primeiros, estes são pensados para levar mais coisas: são perfeitos para compras, para um dia na praia ou no campo, e também para quem anda sempre com muita coisa atrás ;)
☞ são todos peças únicas e estão disponíveis na loja.
[para quem pergunta: sim, haverá uma nova coleção de sacos Frida Kahlo! estou a trabalhar nela, e estará pronta até ao final do mês. estejam atentos :) ]